Sábado, 4

                                           William Gaskill

“O inglês”, diz uma personagem inventada por Lluisa Cunillé, na sua belíssima Barcelona, Mapa de Sombras, “é língua boa para telegramas”. Sim, é verdade, é língua rápida,  permite bons títulos, grande poesia, diálogos cortantes (ah, Harold Pinter!). E é tão difícil de traduzir, credo. Tenho, ali, ao lado da cama, o livro de William Gaskill (o enorme director britânico, esquecido por cá, nunca conhecido, sempre por cá ofuscado por gente bem mais vistosa e oca, nem digo os nomes, mas penso-os). É um livro de 170 pgs, editado este ano pelos Nick Hern Books, e é tudo, análise da história do teatro, comentário literário, programa estético, anedotário, tudo em 170 pgs recolhendo 80 anos de vida e 60 de teatro. Chama-se “Words Into Action” e dou um doce a quem conseguir encontrar melhor definição do trabalho de criação teatral – e a quem conseguir traduzir estas três palavras na mesma telegráfica poesia. E, lá pelo meio, Gaskill (o homem que dirigiu maravilhosamente Beckett, Brecht, Farquhar, descobriu Hare, descobriu Bond – dirigiu o Saved ! -  e foi, durante anos professor na RADA (é o melhor professor, diz Maggie Smith, sua cúmplice de tanto teatro), descreve a sua profissão de encenador: é trabalhar “from the text outwards”.  Não, não se pode traduzir “ do texto para fora”, fica a faltar qualquer coisa, o movimento. Poderá ser “abrindo o texto”, ou poderíamos usar o verbo “extrair”? Não sei, não consigo. Vou ler – e, para aqueles que, tantos, acham que “encenar” é “fazer bonitinho/ mentir/ aldrabar”, vai com esta leitura uma oração de Páscoa: arrependam-se, ainda é tempo.


Jorge Silva Melo

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