As folhas caídas

Nada de muito diferente de há quarenta mil anos.
Estes alunos são ainda homens das cavernas.
Verdadeiramente totémicos,
os pré-históricos alunos
desenham falos em livros de encantar,
castigam as páginas de belos livros com
conspícuos e vigorosos membros
deteriorando os materiais, aviltando o texto,
sobrepondo à cândida ilustração
a sua leitura do mundo,
a sua arma de escolha.

As meninas ficam horrorizadas.
Nem falam.

As pinturas rupestres estão agora por todo o lado:
livros, carteiras, paredes
como nas paredes das cavernas há quarenta mil anos…
E em que é que estas diferem daquelas?
E o que é uma sala de aula senão uma caverna
e as paredes paredes?
Civilizações de permeio apenas,
a possibilidade de rinoplastia…

Eu olho-os com os seus occipitais protuberantes,
na depressão de testa e mento,
na fria latitude pleistocénica
desta caverna
onde Platão não tem lugar,
apenas o mamute que prenuncio lá fora,
gélido como um temporal,
proboscídeo, adventício,
anunciando a era do elefante.

As folhas caem. Os falos também…
Tudo está solto, caduco.
Estes alunos são os elefantes que o mamute anuncia.
E os genitais continuam a ser um modo de expressão,
de pôr trombas em todo o lado, epigramas
assomando nesta tarde cinzenta,

Enquanto tiro o olhar
pelo ponto de fuga da janela,
o meu olhar irreprimível
face aos lenhos
vigorosamente inscritos
na paisagem.


Daniel Jonas
O poema foi publicado no suplemento P2 do jornal Público na edição de 28 de Janeiro 2012

Comments

Popular Posts